O que é a Doença de Graves?
A Doença de Graves constitui-se como a forma mais frequente de hipertiroidismo, ocorrendo em 20-30/ 100 000 indivíduos, predominantemente mulheres e entre os 30-60 anos de vida. É uma entidade clínica de origem auto-imune, resultante da estimulação da glândula tiroideia pelos anticorpos contra o receptor da hormona tiroideia (TRABs).
Existem alguns fatores de risco para o desenvolvimento desta patologia: tabagismo, dieta rica em iodo, stress, gravidez e história familiar de doenças auto-imunes.
Qual a etiologia da Doença de Graves?
A Doença de Graves resulta da alteração do sistema imune, responsável pela defesa do nosso organismo. O sistema imune é responsável pela produção de anticorpos, proteínas que destroem e combatem substâncias extrínsecas ao nosso organismo, como microrganismos infecciosos. Sem que se saiba propriamente a razão, por vezes, o sistema imune produz anticorpos contra células do próprio organismo. No caso específico da D. Graves, são produzidos anticorpos contra células da glândula tiroideia. Estes anticorpos ligam-se ao receptor da hormona estimuladora da tiróide, promovendo uma estimulação da glândula com aumento da síntese e consequente libertação para a circulação de hormona tiroideia.
Quais os sinais e sintomas?
A hormona tiroideia é responsável por várias funções no metabolismo, como a regulação da temperatura corporal e metabolismo basal, humor, frequência cardíaca e metabolismo ósseo. Assim, quando existe hormona tiroideia em excesso em circulação, frequentemente são descritos sintomas como perda de peso, intolerância ao calor, ansiedade e irritabilidade, alteração do sono, tremor das mãos, palpitações, aumento do trânsito intestinal e fadiga.
Paralelamente à doença tiroideia, pode haver atingimento ocular com inflamação dos músculos e tecidos envolventes ao olho e, em 30% dos casos, exoftalmia (protusão do olho), denominada orbitopatia de Graves.A doença ocular pode ocorrer antes, durante ou após a doença tiroideia e tem o tabaco como principal factor de agravamento. Associada à Doença de Graves podem também ocorrer, menos frequentemente, alterações da pele, com vermelhidão e manchas típicas, designadas de dermopatia de Graves.
Como se faz o diagnóstico?
O hipertiroidismo clínico diagnostica-se na presença de TSH suprimida ou baixa e elevação das frações livres de T4 e T3. Para o diagnóstico da Doença de Graves é também necessária a presença do anticorpo contra o receptor da hormona tiroideia (TRABs).
A ecografia e a cintigrafia tiroideia podem ser 2 exames úteis na avaliação da Doença de Graves. A ecografia mostra habitualmente uma glândula aumentada e hipervascularizada e a cintigrafia demonstra uma hiperfixação de toda a glândula tiroideia, confirmando a hiperactividade em que esta glândula se encontra.
Quais as possíveis complicações?
Quando não tratado, o hipertiroidismo por Doença de Graves, pode provocar complicações como:
- Patologia Cardíaca: o hipertiroidismo não controlado está associado a alterações da frequência cardíaca, alterações estruturais e funcionais dos músculos cardíacos e consequente disfunção da contratilidade e insuficiência cardíaca. O hipertiroidismo constitui um fator de risco para o desenvolvimento de arritmias cardíacas (fibrilhação auricular), insuficiência cardíaca e aumento da mortalidade por doença coronária
- Tempestade Tiroideia: entidade rara e grave, resultante do aumento drástico de hormonas tiroideias em circulação. Requer diagnóstico e tratamento imediato, pelo risco de vida associado (mortalidade de 10%). Os sintomas mais frequentes são a febre, sudorese, náuseas e vómitos, delirium, fraqueza, convulsões, palpitações ou arritmia cardíaca e icterícia. Esta condição associa-se frequentemente a falência multi-orgânica e deve ser tratada em contexto de urgência hospitalar.
- Na gravidez: uma mulher grávida com Doença de Graves não controlada tem maior risco de complicações materno-fetais, nomeadamente maior risco de aborto, parto-pré-termo, difunção tiroideia do feto, pré-eclampsia e restrição do crescimento intra-uterino. A mulher com Doença de Graves que pretenda engravidar deve ser acompanhada desde a pré conceção, durante a gravidez até ao período após a parto, e o bebé deve ser avaliado ao nascer (uma vez que os anticorpos passam da mãe para o filho).
- Osteoporose: no hipertiroidismo não tratado verifica-se maior risco de fraturas ósseas.
Qual o tratamento?
O objectivo do tratamento da doença de Graves, consiste na cessação da produção de hormonas tiroideias pela tiróide e consequente inibição das suas ações no organismo. Existem três tipos de tratamento disponíveis.
1. Terapêutica com Anti-tiroideus de Síntese (ATS)
Os ATS interferem diretamente com os mecanismos de produção da hormona tiroideia. Numa situação fisiológica, para que sejam produzidas hormonas tiroideias é necessária a captação de iodo para dentro das células da tiróide. Os ATS usam o iodo como alvo terapêutico, bloqueando o seu uso pelas células tiroideias. Os fármacos mais usados são o metimazol (MMI) e o propiltiouracilo (PTU). O MMI é mais usado que o PTU pelo seu perfil de segurança e tolerância (com a exceção do 1º trimestre da gravidez).
Estes fármacos são indicados como primeira linha do tratamento da Doença de Graves, sendo que o tratamento deve durar cerca de 12 a 18 meses consoante a resposta clínica. Sabe-se que cerca de 50-55% dos doentes apresentam remissão após este período. Efeitos secundários dos ATS são raros mas podem incluir rash cutâneo, dor articular, febre, insuficiência hepática ou alterações do hemograma (agranulocitose)
2. Terapêutica com Iodo radioativo
Consiste na toma de um comprimido com Iodo radiactivo (iodo131). O iodo131 é captado pela glândula tiroideia e a sua radiação será responsável pela destruição celular, sobretudo das áreas hiperfuncionantes, melhorando a sintomatologia do hipertiroidismo. Os doentes com indicação para este tratamento são aqueles com recidiva da doença após terapêutica com anti-tiroideus ou com intolerância aos mesmos. Este tratamento está contra-indicado em mulheres em idade fértil que desejem engravidar, grávidas ou mulheres em amamentação. É desaconselhado em doentes com oftalmopatia de Graves moderada e grave. A principal complicação deste tratamento é o hipotiroidismo, que ocorre em 5-50% dos doentes.
3. Terapêutica Cirúrgica
A opção cirúrgica, é considerada em doentes com Doença de Graves que tenham concomitantemente nódulos na tiróide (bócio multinodular), orbitopatia de graves, hiperparatiroidismo concomitante ou ainda em doentes com contra-indicação para as terapêuticas descritas anteriormente. A grande vantagem desta abordagem é a resolução rápida e definitiva, tendo contudo desvantagens, nomeadamente o risco operatório inerente à cirurgia, risco de lesão do nervo recorrente (responsável pela voz), hipoparatiroidismo (por lesão das paratiroides) e o hipotiroidismo com necessidade de suplementação permanente de hormona tiroideia.
4. Terapêutica com beta-bloqueantes
Embora não interfiram na produção de hormonas tiroideias, os beta- bloqueantes são usados no controlo sintomático do hipertiroidismo. São uma classe farmacológica para controlo de sintomas adrenérgicos, nomeadamente palpitações, tremores, intolerância ao calor, hipersodurese e ansiedade.
Prognóstico
A evolução da doença de Graves quando tratada com antitiroideus de síntese, é bastante favorável. Contudo, a recidiva da Doença de Graves após esta terapêutica, estima-se que ocorra em 53% dos doentes, sendo por isso aconselhada a manutenção do seguimento médico desta patologia.
Os doentes que desenvolvem hipotiroidismo, necessitam de suplementação da hormona tiroideia, com a toma de um comprimido diário para toda a vida, de modo a garantir o eutiroidismo.