O que é?
O Hipotiroidismo Congénito (HC) é a síndrome clínica resultante de uma glândula tiroideia ausente ou sub-desenvolvida (disgenesia) ou de uma glândula tiroideia desenvolvida, contudo sem produção hormonal adequada (disormonogénese). O termo congénito refere-se à presença da condição desde o nascimento. Recém-nascidos com hipotiroidismo congénito não produzem níveis de hormonas tiroideias suficientes para as necessidades corporais.
O que é a glândula da tiróide e para que serve?
A glândula tiroideia situa-se na parte anterior do pescoço, abaixo da maça de Adão. A função desta glândula é produzir hormonas tiroideias (principalmente T4 e uma pequena quantidade de T3), as quais são libertadas na corrente sanguínea e distribuídas por todos os tecidos do corpo. As hormonas tiroideias têm um papel importante no desenvolvimento e crescimento adequado, bem como na regulação do metabolismo, energia corporal, função cardíaca e de outros órgãos do nosso corpo. São também fundamentais para o desenvolvimento cerebral.
Quais as causas?
As causas mais comuns (responsáveis por 75% dos casos) de HC são as alterações no desenvolvimento da tiróide (disgenesias). Durante a gravidez o desenvolvimento da glândula tiroideia inicia-se na base da língua, migrando durante o crescimento intra-uterino para a zona inferior do pescoço (abaixo da maça de Adão). Alterações durante este processo podem resultar em:
Glândula tiroideia numa localização anormal - tiróide ectópica
Glândula tiroideia subdesenvolvida - hipoplasia da tiróide
Glândula tiróideia ausente - agenesia da tiróide
Habitualmente, estas alterações não são herdadas geneticamente, pelo que a probabilidade de ter outro bebé com a mesma doença é baixa.
Menos frequentemente, o HC também pode resultar de disormonogénese (responsável por 25% dos casos): condição em que ocorre uma alteração/deficiência na produção/libertação de hormonas tiroideias, apesar da glândula tiroideia estar bem desenvolvida e em localização normal. Esta forma de HC pode ser hereditária e existe uma probabilidade de 25% (1 em cada 4) de um futuro bebé dos mesmos pais também ser afetado.
Manifestações clínicas/ sinais e sintomas
A maioria dos recém-nascidos com HC (>95%) não apresenta sintomas da doença ao nascimento, uma vez que as hormonas tiroideias maternas atravessam a placenta, permitindo um desenvolvimento adequado. O rastreio neonatal permite o diagnóstico da doença antes do desenvolvimento de sinais / sintomas.
Se não tratado, recém-nascidos com HC podem apresentar sinais e sintomas compatíveis com hipotiroidismo, que se desenvolvem em algumas semanas / meses. O quadro clínico inclui sonolência, dificuldades na alimentação, icterícia prolongada (pele amarela), obstipação, diminuição do tónus muscular (flacidez), extremidades frias, pele seca e atraso no crescimento.
Em alguns bebés com disormonogénese, na avaliação ecográfica pré-natal pode ser identificado um aumento do volume da glândula tiroideia (bócio), enquanto noutros, este sinal é distinguido na avaliação física inicial do recém-nascido ou mesmo no decorrer de algumas semanas.
Quando o diagnóstico é tardio, atraso mental grave associado a alterações neurológicas pode desenvolver-se. O prognóstico das alterações neurológicas depende da idade de início da terapêutica, sendo mais grave em crianças com agenesia da tiróide (ausência da glândula). No entanto, se o tratamento for iniciado imediatamente, as crianças com HC apresentam um crescimento e desenvolvimento psicomotor semelhante aos pares.
Como é diagnosticado?
Em Portugal, a prevalência de HC é de 1 em cada 3200 recém-nascidos e o seu diagnóstico é realizado no âmbito do Programa Nacional de Rastreio Neonatal, vulgarmente conhecido como “teste do pézinho”.
O rastreio consiste na colheita de sangue do calcanhar do recém-nascido a partir do 3º dia de vida e preferencialmente até ao 6º dia. A partir do material colhido é doseada a TSH (hormona estimuladora da tiróide) cujo resultado inferior a 10mU/L exclui o diagnóstico de HC e um resultado superior a 40mU/L confirma o diagnóstico. Valores intermédios requerem nova colheita de sangue ou doseamento de T4 Total (hormona da tiróide). (esquema 1).
>10mU/L
<10mU/L
Mais tarde, poderá ser realizada uma ecografia ou cintigrafia tiroideia com vista à determinação da causa do hipotiroidismo congénito.
Como se trata?
O tratamento consiste na reposição das hormonas tiroideias em falta e deve ser iniciado imediatamente após o diagnóstico e o mais precocemente possível. É administrada diariamente Levotiroxina, uma hormona tiroideia sintética, idêntica à hormona T4 produzida pelo nosso corpo.
Atualmente, a Levotiroxina existe apenas sob a forma de comprimido (nomes comerciais: Letter®, Thyrax®, Euthyrox®) e deve ser tomada em jejum (30 minutos antes do pequeno-almoço) uma vez que alimentos podem alterar a sua absorção.
Nas crianças mais pequenas, os comprimidos podem ser esmagados e misturados com uma pequena quantidade de líquido (água ou leite) e administrados com uma colher ou seringa diretamente na boca do bebé. A Levotiroxina não deve ser adicionada ao conteúdo do biberão, uma vez que o bebé pode não a ingerir na totalidade.
A dose de Levotiroxina deve ser ajustada de acordo com o crescimento do bebé, pelo que os níveis de TSH e de hormonas tiroideias devem ser monitorizados regularmente. O acompanhamento inicial é habitualmente assegurado por um Endocrinologista Pediátrico. É extremamente importante que o tratamento seja cumprido diariamente, por forma a manter níveis hormonais estáveis.
Existem efeitos adversos do tratamento?
O tratamento com Levotiroxina repõe os níveis de hormona tiroideia que a tiróide não é capaz de produzir, pelo que se administrada na dose adequada, habitualmente não tem efeitos adversos associados.
Quando a dose de Levotiroxina é insuficiente as crianças podem apresentar sonolência, menor atividade, cansaço fácil, obstipação, extremidades frias ou uma desaceleração no crescimento; quando a dose é excessiva pode notar-se tremor, hiperactividade, dificuldade em dormir, aumento do apetite sem aumento de peso, dejeções frequentes ou diarreia.
O tratamento é feito para sempre? Existem consequências a longo prazo?
Para a maioria dos bebés, a terapêutica com reposição de hormonas tiroideias será necessária durante toda a vida, no entanto com tratamento adequado, estas crianças apresentam um crescimento e desenvolvimento normal, sem quaisquer restrições de atividades.
mensagens-chave:
- O Hipotiroidismo Congénito é a síndrome clínica resultante de uma glândula tiroideia ausente ou sub-desenvolvida (disgenesia) ou de uma glândula tiroideia desenvolvida, contudo sem produção hormonal adequada (disormonogénese).
- O rastreio neonatal permite o diagnóstico do Hipotiroidismo Congénito antes do desenvolvimento de sinais / sintomas. Quando o tratamento é iniciado precocemente, as crianças com esta doença apresentam um crescimento e desenvolvimento psicomotor semelhante aos pares.
- O tratamento do Hipotiroidismo Congénito consiste na reposição das hormonas tiroideias em falta. A Levotiroxina, uma hormona idêntica à hormona T4 produzida pelo nosso corpo, deve ser administrada diariamente e a sua dose deve ser ajustada de acordo com o crescimento do bebé, pelo que é essencial uma monitorização regular.