Glândulas e doenças Endócrinas

Síndrome de Klinefelter

A Síndrome de Klinefelter, descrita em 1942, constitui uma condição genética caracterizada pela presença de cromossoma X extra. Afeta exclusivamente indivíduos do sexo masculino e representa a anomalia cromossómica (aneuploidia) mais comum, com uma incidência estimada de 1,5 em cada 1000 indivíduos.

Em geral, cada célula do corpo contém 46 cromossomas organizados em 23 pares. Um cromossoma de cada par é herdado da mãe e o outro do pai. Um desses pares é conhecido como cromossomas sexuais. As mulheres têm dois cromossomas sexuais do mesmo tipo (XX) e os homens dois cromossomas sexuais diferentes (XY).

Na síndrome de Klinefelter, a forma clássica (observada em 80-90% dos casos), resulta da presença de um cromossoma X extra-numerário – cariótipo 47,XXY (em vez de 46,XY). Outras formas menos frequentes podem manifestar-se pela presença de um número ainda maior de cromossomas X (Ex: cariótipos 48,XXXY; 49, XXXXY ou mosaico 46,XY/47XXY48).

É a causa mais comum de hipogonadismo (défice de testosterona) primário no homem, traduzindo-se numa incapacidade de os testículos responderem de forma adequada com produção de testosterona ao estímulo hipofisário das gonadotrofinas (hormona folículo-estimulante – FSH e hormona luteiniziante - LH).

 

Manifestações clínicas

O diagnóstico é invulgarmente realizado ao nascimento, já que ambiguidades sexuais são raras. É habitualmente durante a infância e puberdade que surgem os primeiros sinais/sintomas que levam à suspeição diagnóstica. As manifestações clínicas incluem alterações relacionadas com o défice de testosterona. Destacam-se como sintomas típicos:

  • Estatura elevada, acima da média, com membros inferiores longos e que levam a uma desproporção entre os segmentos superior e inferior;
  • testículos pequenos;
  • ginecomastia;
  • diminuição da pilosidade corporal;
  • infertilidade;
  • aumento da gordura abdominal;
  • alterações neuro-cognitivas com dificuldade de aprendizagem podem também estar presentes.

Apesar das manifestações clássicas, a síndrome de Klinefelter está associada a uma elevada variabilidade fenotípica, dificultando o diagnóstico atempado. Alguns estudos estimam que 50-75% dos doentes com esta síndrome nunca chegam a ser diagnosticados.

 

Etiologia

A síndrome de Klinefelter é uma condição genética, mas não é “herdada” dos pais. Geralmente ocorre de forma aleatória durante o desenvolvimento precoce no útero resultante de um erro no processo de divisão celular, levando a um óvulo ou um espermatozoide com uma cópia extra de um cromossoma X.

 

Diagnóstico

A marcha diagnóstica tem início com a história clínica e exame físico, com o objetivo de identificar sinais/sintomas atribuíveis a hipogonadismo. A avaliação laboratorial inclui doseamentos de testosterona e gonadotrofinas (FSH e LH), observando-se habitualmente, nestes doentes, diminuição da testosterona e aumento das gonadotrofinas. Pode ser ainda solicitado espermograma que frequentemente demonstra azoospermia (ausência espermatozoides).

A confirmação diagnóstica é obtida através do cariótipo.

 

Abordagem / Tratamento

Nos homens com evidência de défice de testosterona, está indicada a sua reposição. As formulações injetáveis ou transdérmicas de testosterona são as atualmente disponíveis em Portugal. Esta reposição permite um aumento da massa muscular e da densidade mineral óssea, aumento da pilosidade corporal e timbre vocal mais grave, conferido uma aparência mais masculina a estes doentes. Associa-se ainda a uma melhoria da função cognitiva, com aumento do foco e atenção.

A identificação precoce da síndrome de Klinefelter permite uma intervenção terapêutica atempada, com o objetivo de prevenir algumas complicações associadas ao hipogonadismo. O défice de testosterona está associado a um aumento da insulinorresistência com consequente diabetes mellitus tipo 2, dislipidémia, esteatose hepática, assim como doença vascular periférica e doença tromboembólica. A diminuição da densidade mineral óssea pode associar-se a osteopenia ou osteoporose.

Os doentes sob terapêutica de reposição com testosterona devem ser seguidos em consulta de Endocrinologia para monitorização de dose e possíveis efeitos secundários. Os efeitos laterais mais frequentes incluem aumento da oleosidade da pele, acne, rash cutâneo (associado a formas transdérmicas), flutuações do humor (mais frequentemente associado a formas transdérmicas), eritrocitose e aumento do PSA (antígeno prostático específico).

Embora a maioria dos doentes com síndrome de Klinefelter assuma o género masculino, alguns desenvolvem perturbações de identidade de género. Nestes, a terapêutica de reposição com testosterona poderá não estar indicada.

Outras complicações associadas à síndrome de Klinefelter, como a ginecomastia e a infertilidade, deverão ter uma abordagem dirigida, já que o tratamento de reposição com testosterona não tem qualquer eficácia nestas situações.

Documentos anexos