Os tumores neuroendócrinos (TNE) derivam de células neuroendócrinas que se encontram dispersas por todo o organismo, podendo por isso ocorrer em qualquer local do corpo, sobretudo no trato gastrointestinal, pâncreas e pulmão.
O trato gastrointestinal é constituído pelo estômago, intestino delgado (duodeno, jejuno e íleon), intestino grosso (cego, cólon e reto) e apêndice e é responsável pela digestão dos alimentos. As células neuroendócrinas aqui localizadas produzem hormonas que ajudam a controlar os sucos digestivos e os músculos responsáveis pela passagem dos alimentos através destes órgãos. Assim, dependendo do local de origem, alguns destes tumores podem associar-se ao excesso de produção de hormonas, causando sinais e sintomas muito específicos.
- Manifestações Clínicas
Nos estádios iniciais, a maioria dos TNE não provoca qualquer manifestação clínica, sendo muitas vezes diagnosticados incidentalmente em exames (endoscopia, colonoscopia, ecografia e tomografia axial computadorizada (TAC).
Contudo, o excesso de produção de hormonas e o crescimento das lesões podem causar sintomas e sinais característicos, dependendo do órgão onde tiveram origem e da hormona secretada:
- Estômago
Os TNE com origem no estômago associam-se frequentemente a outras condições clínicas como gastrite crónica atrófica e anemia perniciosa (tipo 1) ou síndromes hereditárias (tipo 2). Habitualmente, as lesões associadas a estes dois tipos têm pequenas dimensões, são múltiplas e têm um comportamento pouco agressivo.
Por outro lado, os TNE do tipo 3 ocorrem comummente de forma isolada, têm maiores dimensões e comportamento mais agressivo.
Enquanto os tumores do tipo 1 são frequentemente assintomáticos, os tumores do tipo 2 podem manifestar-se com azia, dor epigástrica e úlceras gástricas, bem como dependência do uso de protector gástrico para aliviar os sintomas. Já os tumores do tipo 3, sendo mais graves, podem manifestar-se com cansaço e palidez, dor abdominal, diarreia e perda de peso. - Duodeno
O duodeno consiste na primeira parte do intestino delgado, estabelecendo a ligação do estômago ao jejuno. Os TNE nesta localização são maioritariamente assintomáticos, no entanto, algumas lesões têm um comportamento mais agressivo podendo associar-se a dor abdominal, obstipação, diarreia, alteração da cor das fezes, enjoos, vómitos, coloração amarelada da pele e/ou olhos (icterícia) e azia. Numa pequena percentagem podem ser hereditários. - Jejuno e Íleo
Para além das manifestações clínicas relacionadas com a localização das lesões, tais como, dor abdominal, perda de peso, distensão do abdómen, cansaço, diarreia, náuseas, vómitos, os TNE com origem no íleo são os que mais frequentemente se associam à síndrome carcinoide.-
- O que é a Síndrome Carcinoide?
A síndrome carcinoide é um conjunto de sintomas e sinais causados pelo excesso de serotonina e outros peptídeos no sangue.
Rubor e sensação de calor da face e pescoço (flushing), diarreia e dor abdominal constante ou intermitente são algumas das manifestações clínicas que caracterizam esta síndrome.
Álcool, cafeína, queijos envelhecidos, peixe/ carne fumado, salgado ou em conserva, chocolate, bananas, frutos secos e alguns medicamentos podem estar associados ao aparecimento/ agravamento dos sintomas, podendo originar quadros graves designados por crise carcinoide. A crise carcinoide pode ainda ser despoletada por situações de stress extremo, como cirurgias e outros procedimentos invasivos, pelo que é necessário o conhecimento desta síndrome antes da intervenção.
- O que é a Síndrome Carcinoide?
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- Cólon e Reto
Na maioria dos casos os TNE do colón são assintomáticos, podendo, no entanto, manifestar-se com alterações do trânsito intestinal, dor abdominal, perda de peso e, raramente, síndrome carcinoide. - Apêndice
A maioria dos TNE do apêndice são diagnosticados aquando da realização de cirurgia por apendicite aguda, podendo, em alguns casos constituir a causa do quadro agudo. Embora raramente, a doença pode apresentar-se de forma mais agressiva e a síndrome carcinoide pode ocorrer nestes estádios mais avançados da doença.
- Estômago
- Como podem ser diagnosticados?
Dependendo da localização das lesões, os TNE podem ser diagnosticados em endoscopias digestivas altas, colonoscopias ou exames de imagem (ecografia, TAC, ressonância magnética (RMN)), que podem ser realizados por queixas associadas ao tumor ou por outros motivos.
O diagnóstico definitivo é feito através de biópsia ou análise das peças operatórias após remoção da lesão.
Após o diagnóstico, é necessário realizar uma colheita de sangue e, eventualmente, de urina para doseamento dos marcadores tumorais e despiste da síndrome carcinoide, respetivamente. Poderá ainda ser necessária a realização de exames de imagem ou funcionais (PET) para exclusão de lesões noutros locais, como por exemplo a nível do fígado. - Tratamento
Tal como os TNE com origem noutros órgãos, dependendo do tipo e do estádio (localizado ou disseminado a outros órgãos/ tecidos), o tratamento dos TNE gastrointestinais pode passar por vigilância, cirurgia, análogos da somatostatina, terapêutica com peptídeos radiomarcados, terapêutica alvo específica, quimioterapia ou radioterapia.
Caso o TNE esteja associado à síndrome carcinoide, para além da terapêutica com análogos da somatostatina, poderá ainda ser aconselhado acompanhamento nutricional e terapêutica sintomática como loperamida (Imodium®). Em casos graves e resistentes, com diarreia de difícil controlo, pode ainda ser usado o telotristat (Xermelo®).
Bibliografia
- Grupo de Estudos de Tumores Neuroendócrinos, Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo. “Tumores Neuroendócrinos”. Disponível em: https://www.spedm.pt/wp-content/uploads/2020/11/dipticos-spedm-6-colp.pdf
- Neuroendocrine Tumor Reserach Foundation. “Neuroendocrine Tumors of the Gastrointestinal Tract”. https://netrf.org/for-patients/nets-info/tumor-site/gi/
- Cancer.NET. 2021. “Neuroendocrine Tumors - Symptoms and Signs”. https://www.cancer.net/cancer-types/neuroendocrine-tumors/symptoms-and-signs