Queridos Sócios da SPEDM,
Recebi da SPEDM um convite para escrever um texto sobre “A Endocrinologia e eu.” Como prévia presidente da SPEDM, presidente do Colégio de Endocrinologia da Ordem dos Médicos e Editora chefe da RPEDM, não podia deixar de aceitar. Aproveito esta oportunidade para partilhar conceitos que fui aprendendo e que considero poderem ser úteis não só para IFEs e jovens endocrinologistas mas também para qualquer médico em início de carreira.
O caminho faz-se andando. As oportunidades e os desafios vão surgindo, apenas temos que estar atentos, curiosos, entusiasmados e ser resilientes. Haverão contrariedades, momentos de desânimo e de grande stresse. Mas as pedras no nosso caminho podem fazer-nos dar grandes saltos para a frente. Aparentes oportunidades perdidas ou portas fechadas são oportunidades para seguir outros rumos, talvez muito mais desafiantes e compensadores.
O conceito de locus de controlo interno vs externo foi algo que gostei muito de aprender. A proporção controlo interno/controlo externo varia de pessoa para pessoa e pode alterar-se ao longo do tempo. É útil conhecer este conceito e perceber a importância de fazer dominar o locus de controlo interno. Quando domina o locus de controlo externo sentimo-nos à mercê dos imponderáveis externos; quando domina o locus de controlo interno, tendemos a encontrar estratégias de resposta à adversidade. É algo que ensino aos meus doentes e é de particular importância nas doenças crónicas.
A insegurança de saber tão pouco não afeta apenas médicos no início de carreira. Eu não sei tudo, nem poderia saber. A quantidade imensa de informação e o acesso a publicações diárias sobre os mais variados assuntos são um desafio enorme e podem dar ao médico um sentimento de insegurança, mas a solução é mais simples do que poderíamos pensar. É preciso assumir que não sabemos tudo, mas que temos um curso e um ensino pós graduado que nos deu as competências para avaliarmos os sintomas e sinais, integrá-los, estudarmos e refletirmos sobre as situações menos claras, tentarmos conseguir um diagnóstico, encontrarmos a terapêutica mais adequada para a doença e para o doente e finalmente conseguirmos a adesão ao tratamento. Este último passo é essencial para a eficácia do tratamento, apesar de ser frequentemente descurado. É a este passo que eu dedico mais tempo na consulta. O que o doente mais precisa é do nosso tempo, atenção e cuidados. Nunca nenhum meu doente ficou preocupado por eu dizer que tenho que refletir sobre o seu problema, falar com outros colegas e decidir quais são os exames prioritários. Apesar de não ter conseguido dar-lhe uma resposta imediata, ele sabe que pode contar com todo o meu empenho e cuidado. Esta postura tira-nos o peso que representa assumir a posição do «dono da verdade».
A propósito da pressa de dar uma resposta, é importante falar do perigo dos rótulos. Quando somos novos e vemos pela primeira vez um doente, sentimos muita pressa em fazer um diagnóstico. Nada mais errado. O importante é iniciar o caminho para a avaliação correta dos sinais e sintomas, na procura da melhor solução. Um diagnóstico errado pode colar-se a uma pessoa e limitar a investigação de outras possibilidades. Temos que ter consciência que os diagnósticos podem não ser definitivos e o cuidado em reclassificar deve estar sempre presente na nossa mente. Quantas vezes, com o avanço da ciência, se descobrem novas entidades nosológicas.
E para terminar quero falar da maravilhosa aventura dos novos desafios. Há o encanto dos primeiros passos, dados com muito cuidado e atenção. Mas é importante sabermos que um escorregar, um pequeno acidente pode comprometer o caminho e levar a retrocessos. Para o sucesso é essencial o trabalho em equipa e a colaboração entre todos. Uma equipa unida, que se respeita, em que as características e qualidades de cada um são valorizadas e aproveitadas tem uma força enorme. Somos todos diferentes e essa diversidade, quando bem aproveitada, é uma enorme fonte de riqueza.
E pareço esquecer as minhas atividades como Professora de Endocrinologia. De modo algum, pois para mim partilhar, fazer perguntas, procurar respostas e ensinar faz parte da minha maneira de ser!