A lipocalina-2 (LCN2), também conhecida como lipocalina associada à gelatinase de neutrófilos (NGAL), oncogene 24p3 ou siderocalina, é uma proteína segregada. Foi identificada pela primeira vez em 1989 como sendo um “produto” que se encontrava aumentado em células de rim de ratinho em resposta à infeção com o vírus da imunodeficiência símia. Em 1993, foi identificada a proteína análoga humana como sendo uma proteína armazenada nos grânulos dos neutrófilos em associação com a proteína metaloproteinase-9, uma gelatinase que promove a degradação da matriz extracelular.
Diversos fatores e condições têm sido descritos como sendo capazes de induzir a síntese LCN2 em vários tecidos e tipos celulares. Em particular, a sua expressão foi amplamente estudada, em tecidos que são mais propensos à infeção, sendo que, a sua principal função se prende com a resposta imune inata. Neste contexto, a LCN2 é capaz de limitar o crescimento bacteriano através de estratégias de depleção de ferro. Para tal, a LCN2 tem a capacidade de se ligar a sideróforos bacterianos (que são moléculas com alta afinidade para o ferro do hospedeiro) carregados com ferro, ficando assim as bactérias impedidas de o capturar. No entanto, dada a descoberta de sideróforos endógenos mamíferos, bem como, de recetores na superfície celular capazes de ligar LCN2 (nomeadamente o 24p3R e a megalina), foram atribuídas novas funções a esta proteína. Assim, mesmo na ausência de infeções, a LCN2 é igualmente produzida e é capaz de interagir com os sideróforos endógenos e ligar-se aos seus recetores na superfície celular, e mediar processos celulares através do transporte de ferro. Por exemplo, foi proposta uma via de aquisição de ferro por parte das células mediada pela LCN2, e consequentemente foi identificado o seu papel na proliferação celular, desenvolvimento e proteção de tecidos, assim como na apoptose. Provavelmente, nesse sentido, a LCN2 surge associada a diferentes tipos de carcinomas e dano celular como é o caso da lesão renal aguda, sendo nestes casos usada como biomarcador de doença e de prognóstico.
Alguns estudos foram feitos para tentar desvendar o papel da LCN2 no cérebro. A título de exemplo, com o nosso trabalho mostramos que, a deleção da LCN2 induz uma diminuição na proliferação das células estaminais neuronais, com impacto em tarefas cognitivas dependentes do hipocampo. Esta diminuição, na proliferação devem-se ao fato das células se encontrarem estagnadas no estado G0/G1 do ciclo celular, induzida pelo aumento dos níveis de stress oxidativo endógeno. Estes achados foram corroborados pela observação de que, a suplementação dos ratinhos que não expressam LCN2, com um quelante de ferro resgata do stresse oxidativo e promove a progressão das células no ciclo celular revertendo os deficits cognitivos.
Recentemente a LCN2 foi também identificada como sendo uma hormona. Neste contexto, foi mostrado em ratinhos que, a LCN2 segregada pelos osteoblastos é capaz de manter a homeostasia da glicose, através da indução da secreção de insulina. Além disso, a LCN2 dos osteoblastos mostrou ser capaz de inibir a ingestão de alimentos uma vez que, quando em circulação, atravessa a barreira hematoencefálica, liga-se ao recetor de melanocortina 4 (MC4R, um novo recetor para a LCN2) nos neurónios paraventriculares e ventromediais do hipotálamo e ativa uma via anorexigênica dependente de MC4R (supressora do apetite).